terça-feira, 19 de abril de 2011

Discursos Punitivos

Na busca por matérias relacionadas a alterações nas políticas de segurança pública nas edições dos jornais de 08/04, não encontrei muito material, como mencionei no post anterior. No entanto, o que eu encontrei (e muito) foram manifestações sobre os acontecimentos. Como não estão relacionadas diretamente a análise, não quis incluí-los no post anterior, mas pensei que elas servem para ilustrar o pano de fundo em que as discussões serão realizadas.


Opiniões de colunistas...

Correio do Povo, Juremir Machado da Silva. A globalização do pior. "[...] Como, no entanto, deixar de pensar que a vida se tornou muito perigosa e que o perigo agora invade os lugares antes considerados sagrados ou inocentes? O medo anda junto com cada um de nós. Quem tem carro vive com medo de chegar em casa. [...] Há um novo imaginário, um novo ar do tempo, uma nova atmosfera, o imaginário do medo, a convivência permanente com o temor, a certeza de que o perigo está sempre rondando. [...] O que estamos fazendo, o que podemos fazer? Como estancar essa violência vertiginosa? Não, a solução não está no autoritarismo ou no retorno à ditadura." (fl. 2)


Chama a atenção as referências ao medo e ao perigo que (agora?!) invade lugares considerados, até então, "sagrados ou inocentes".  Chama mais atenção ainda a resposta negativa à uma suposta "alternativa" ditatorial à violência - alternativa esta que em nenhum outro momento aparece no texto do autor, aparecendo somente nessa negativa a uma resposta (do leitor, talvez?) que a teria afirmado, mas que não está no texto, colocando-a, no final das contas, como uma das respostas possíveis ao questionamento das medidas a serem adotadas.

Zero Hora, David Coimbra. Por um Brasil sem armas. "[...] Uma reação ilógica, o crime terrível já havia acontecido, mas entendi esses pais. Porque eu também, olhando para o meu filhinho, senti o coração apertado e tive vontade de guardá-lo onde ficasse a salvo do Mal. [...] Podemos tentar compreender por que isso aconteceu e o que fez com que isso acontecesse, para que possamos tomar precauções. Para tentar evitar que se repita. [...] Há seis anos, o Brasil promoveu um plebiscito sobre o desarmamento. Venceu a ingenuidade das pessoas de bem que acreditam que, armadas, vão proteger suas famílias e seu patrimônio. Não vão. As armas que o cidadão honesto compra pra se defender acabarão nas mãos de bandidos ou de malucos como o do Rio." (fl. 2)

O "Mal" em letras maíusculas, a referência às "pessoas de bem", ingênuas, ao "cidadão honesto", aos "bandidos" e a "malucos" dão o tom maniqueísta e até ingênuo (se não fosse intencional) do autor. Está posta a ideia de que, a partir do conhecimento a respeito do fato poderemos prevenir novos acontecimentos.


A construção de um perfil...

Correio do Povo, Atirador era discreto. [...] Para o psiquiatra forense Marcos Gebara, o criminoso apresentaria algum transtorno de personalidade. [...] Gebara observou que o texto parece escrito por alguém sob "surto psicótico paranóide delirante alucinatório" (fl. 30)

Zero Hora, Atirador era "estranho" e se distanciava de todos. [...] - Só ficava na internet, não tinha amigos, era muito estranho. Só falava de negócio de muçulmano. [...] Sua estrutura mental provavelmente já estava bastante danificada. Ninguém comete um crime desse porte de uma dia para o outro - avalia Ilana Casoy, uma das principais especialistas brasileiras no estudo de crimes violentos e assassinatos em série." (fl. 8)


Ao redor do mundo: de Columbine a conflitos entre índios e colonizadores

As referências aos acontecimentos na escola Columbine, nos EUA, em 1999, são uníssonas. Em todos os jornais há quadros indicando "outros casos no mundo". O Correio do Povo (fl. 31) mostra oito casos, de abril de 2010 a setembro de 2006, em diversos países. A Zero Hora aponta quatro eventos, de agosto de 1966 a abril de 2007 (fl. 8). O "campeão", no entanto, foi o jornal Pioneiro: referencia 21 eventos que vão de janeiro de 1989 a setembro de 2008 e, ainda, apresenta a seguinte nota (como sempre, sem maiores referências): "Massacres de estudantes em escolas e universidades começaram nos Estados Unidos 12 anos antes da independência do país. Em 1764, guerreiros indígenas invadiram uma escola maternal de colonos brancos e mataram 10 crianças e dois professores na Pensilvânia." (fl. 4).


Como falar da chacina em casa for dummies

A Zero Hora publicou uma matéria intitulada Como falar da chacina em casa, com conselhos de profissionais das áreas psi sobre como os pais deveriam agir em relação ao assunto com seus filhos. Só faltou o infográfico (:-P)

O Pioneiro traz a declaração de uma psícologa que diz que "[...] as crianças que têm saúde mental vão se recuperar mais rapidamente do que as que já trazem vivência de violência ou abuso."


Dr. Jekkil ou Mr. Hyde?
 
Mas, sou obrigado a admitir, a "cereja" do bolo foi a enquete realizada pela Zero Hora/Rádio Gaúcha (fl. 2), em que os leitores deveriam telefonar para votar. A "questão" era a seguinte:

"O assassino das crianças em escola no Rio de Janeiro
é um monstro? 3299-2601
ou um ser humano? 3299-2602"

Com todas essas informações "qualificadas", só podemos esperar um debate público de qualidade... (oh my...)

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