segunda-feira, 2 de maio de 2011

Um diário institucional... será?

Na última aula (que, por conta da hérnia, não pude participar), foi feita uma inversão na ordem dos textos para leitura, para antecipar a leitura daqueles relacionados ao diário institucional. Quando descobri isso (no sábado à noite), confesso que fiquei um tanto quanto frustrado, pois já tinha lido o texto inicialmente planejado para a semana seguinte. Buenas, não havia muito o que  fazer. Um dos textos combinados (o do Remi Hess) eu já havia lido para a última aula que eu havia ido. Hoje resolvi examinar o texto do Lourau. Depois de lê-lo, fiquei até feliz com a inversão.

O texto do Lourau faz parte de um livro organizado a partir de série de encontros com ele - o texto é o "Encontro n. 4". Esse foi o segundo texto que eu li que trata do(s) diário(s) e de sua produção. O do Remi Hess fala sobre as características comuns aos diversos tipos de diário e sobre alguns tipos de diário mais conhecidos. Para minha frustração, a parte dedicada ao "diário institucional" é relativamente pequena. No entanto, a escrita do diário como exercício de congruência entre a teoria e a "prática" do pesquisador, e a importância do momento da releitura do diário como momento de análise foram ideias importantes que ficaram dessa leitura.

O texto do Lourau, por outro lado, trabalha muito mais a importância da elaboração do diário em torno da questão da implicação e, por conseguinte, da desnaturalização da "neutralidade¨ do discurso científico. A escrita do diário e sua revelação tornam-se modos de ação política, pois podem ou não colocar em questão a pretensa neutralidade de produção do saber dito científico. Ao mostrar a temporalidade da produção da pesquisa, o diário permite também que o pesquisador perceba não só a produção da pesquisa, mas também a sua produção enquanto sujeito naquela pesquisa, a qual deixa de ser fruto unicamente de um discurso no qual o pesquisador é o "centro", mas aparece em toda sua historicidade através das condições de possibilidade que a tornaram daquela forma e não de outra.

Mais importante, contudo, foi o fato desse texto ter feito com que eu percebesse que eu não estou produzindo um diário da pesquisa propriamente dito, pois mesclo partes de um diário e partes da própria pesquisa. Até o momento, estava mais preocupado em relatar os  "achados"  do dia a dia, as análises que eu tinha feito a partir do material de pesquisa que eu tinha encontrado, do que relatar como tinha encontrado o material, como tinha, chegado àquelas análises - enfim, usando uma expressão do texto do Lourau, ao invés de expressar um "fora do texto" (ou seja, algo para além do texto a ser institucionalizado em alguma forma acadêmica), meu diário estava se tornando um armazenamento do próprio "texto", contudo, permeado por uma escrita descontínua.

Não sei até que ponto isso descaracteriza o que vinha fazendo até aqui como diário institucional - a Nair, a professora da disciplina, leu o blog e não comentou nada que indicasse que eu teria "fugido do tema". No entanto, a leitura do texto do Lourau fez-me ver que, se eu não estava fugindo do tema, pelo menos estava deixando de fora do diário seu principal foco - as minhas implicações nessa "pesquisa" que eu criei para produzir meu diário institucional. Novamente, fazendo uso de um termo do Lourau, talvez estivesse com minha "autocensura" ligada no máximo. A reflexão no post anterior sobre "para que pesquisamos?" e "para quem pesquisamos?" já possibilitou que eu "me soltasse mais" na escrita. Se eu aproveitar o ritmo, talvez possa produzir algo mais próximo daquilo que agora se tornou meu objetivo nesse diário.

Apenas para registrar, confesso que essa reiteração na importância  da análise da implicação do pesquisador durante a pesquisa como um aprimoramento da "congruência" me incomoda um pouco. Considero importante a análise das implicações da produção pelo próprio pesquisador como uma questão ética inclusive, principalmente diante da compreensão da produção do conhecimento como ação política. Por essa razão, não sei se pensar em termos de congruência  seja útil nesse caso, ou talvez nem mesmo indicado, pois, ao contrário, eventual "incongruência" não se daria (exceto em casos extremos) entre as ações ou discurso do próprio pesquisador, mas entre aquilo a que ele se propõe atingir com a sua produção e os efeitos que essa produção gera no mundo (os quais, como já disse, se realizam na interação com outras práticas e discursos para além do pesquisador).

Outro questão que me veio agora foi que, talvez, nem precisasse ter criado essa pesquisa sobre a questão do impacto das mortes no Realengo para produzir meu diário institucional. As próprias aulas e minha relação com os textos, as reflexões antes e depois das aulas, tudo isso já daria um bom diário institucional. Talvez até mais interessante e rico. Coisas para se pensar - nunca é tarde para mudar de rumo.

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