quinta-feira, 9 de junho de 2011

Fim(?)

Este será o último post que escrevo neste blog, ao menos, será o último vinculado a sua meta inicial: ser o diário institucional a ser produzido na disciplina Processos Institucionais e Estratégias Analíticas. No dia 27/05 me dei conta de que eu estava buscando analisar implicações produzindo uma "pesquisa", quando eu já tinha implicações suficientes a serem analisadas nos diversos contextos institucionais em que estou inserido. Da mesma forma, entendi que, para fazer isso, essa ferramenta, o blog, não seria a mais adequada. A ideia da análise sobre os diversos discursos sobre os acontecimentos naquela escola no bairro Realengo permanece, mas, agora, enquanto possibilidade...

sábado, 7 de maio de 2011

XI Congresso Luso Afro Brasileiro de Ciências Sociais

Estava escrevendo o próximo post sobre Realengo, mas mais um acontecimento se atravessou na escrita desse diário: o trabalho que o prof. Rodrigo Ghiringhelli de Azevedo e eu encaminhamos para o XI Congresso Luso Afro Brasileiro de Ciências Sociais foi aceito, e devemos remeter o trabalho completo até 03/06. Considerando que estou saindo de férias em 13/05 (Hola, Buenos Aires) e volto de viagem só 25/05, estou com um prazo mais que apertado a ser cumprido e terei que deixar o diário um pouco de lado. De volta, só após 03/06... Hasta pronto...

segunda-feira, 2 de maio de 2011

Um diário institucional... será?

Na última aula (que, por conta da hérnia, não pude participar), foi feita uma inversão na ordem dos textos para leitura, para antecipar a leitura daqueles relacionados ao diário institucional. Quando descobri isso (no sábado à noite), confesso que fiquei um tanto quanto frustrado, pois já tinha lido o texto inicialmente planejado para a semana seguinte. Buenas, não havia muito o que  fazer. Um dos textos combinados (o do Remi Hess) eu já havia lido para a última aula que eu havia ido. Hoje resolvi examinar o texto do Lourau. Depois de lê-lo, fiquei até feliz com a inversão.

O texto do Lourau faz parte de um livro organizado a partir de série de encontros com ele - o texto é o "Encontro n. 4". Esse foi o segundo texto que eu li que trata do(s) diário(s) e de sua produção. O do Remi Hess fala sobre as características comuns aos diversos tipos de diário e sobre alguns tipos de diário mais conhecidos. Para minha frustração, a parte dedicada ao "diário institucional" é relativamente pequena. No entanto, a escrita do diário como exercício de congruência entre a teoria e a "prática" do pesquisador, e a importância do momento da releitura do diário como momento de análise foram ideias importantes que ficaram dessa leitura.

O texto do Lourau, por outro lado, trabalha muito mais a importância da elaboração do diário em torno da questão da implicação e, por conseguinte, da desnaturalização da "neutralidade¨ do discurso científico. A escrita do diário e sua revelação tornam-se modos de ação política, pois podem ou não colocar em questão a pretensa neutralidade de produção do saber dito científico. Ao mostrar a temporalidade da produção da pesquisa, o diário permite também que o pesquisador perceba não só a produção da pesquisa, mas também a sua produção enquanto sujeito naquela pesquisa, a qual deixa de ser fruto unicamente de um discurso no qual o pesquisador é o "centro", mas aparece em toda sua historicidade através das condições de possibilidade que a tornaram daquela forma e não de outra.

Mais importante, contudo, foi o fato desse texto ter feito com que eu percebesse que eu não estou produzindo um diário da pesquisa propriamente dito, pois mesclo partes de um diário e partes da própria pesquisa. Até o momento, estava mais preocupado em relatar os  "achados"  do dia a dia, as análises que eu tinha feito a partir do material de pesquisa que eu tinha encontrado, do que relatar como tinha encontrado o material, como tinha, chegado àquelas análises - enfim, usando uma expressão do texto do Lourau, ao invés de expressar um "fora do texto" (ou seja, algo para além do texto a ser institucionalizado em alguma forma acadêmica), meu diário estava se tornando um armazenamento do próprio "texto", contudo, permeado por uma escrita descontínua.

Não sei até que ponto isso descaracteriza o que vinha fazendo até aqui como diário institucional - a Nair, a professora da disciplina, leu o blog e não comentou nada que indicasse que eu teria "fugido do tema". No entanto, a leitura do texto do Lourau fez-me ver que, se eu não estava fugindo do tema, pelo menos estava deixando de fora do diário seu principal foco - as minhas implicações nessa "pesquisa" que eu criei para produzir meu diário institucional. Novamente, fazendo uso de um termo do Lourau, talvez estivesse com minha "autocensura" ligada no máximo. A reflexão no post anterior sobre "para que pesquisamos?" e "para quem pesquisamos?" já possibilitou que eu "me soltasse mais" na escrita. Se eu aproveitar o ritmo, talvez possa produzir algo mais próximo daquilo que agora se tornou meu objetivo nesse diário.

Apenas para registrar, confesso que essa reiteração na importância  da análise da implicação do pesquisador durante a pesquisa como um aprimoramento da "congruência" me incomoda um pouco. Considero importante a análise das implicações da produção pelo próprio pesquisador como uma questão ética inclusive, principalmente diante da compreensão da produção do conhecimento como ação política. Por essa razão, não sei se pensar em termos de congruência  seja útil nesse caso, ou talvez nem mesmo indicado, pois, ao contrário, eventual "incongruência" não se daria (exceto em casos extremos) entre as ações ou discurso do próprio pesquisador, mas entre aquilo a que ele se propõe atingir com a sua produção e os efeitos que essa produção gera no mundo (os quais, como já disse, se realizam na interação com outras práticas e discursos para além do pesquisador).

Outro questão que me veio agora foi que, talvez, nem precisasse ter criado essa pesquisa sobre a questão do impacto das mortes no Realengo para produzir meu diário institucional. As próprias aulas e minha relação com os textos, as reflexões antes e depois das aulas, tudo isso já daria um bom diário institucional. Talvez até mais interessante e rico. Coisas para se pensar - nunca é tarde para mudar de rumo.

sábado, 30 de abril de 2011

"Para que pesquisamos? Para quem pesquisamos?": a produção do conhecimento como ação política


“Para que pesquisamos? Para quem pesquisamos?” Essa foi a provocação deixada na aula de 22/04 para que iniciássemos a escrita de nossos diários. Como eu já tinha iniciado a minha, a provocação “atravessou” essa escrita. Por outro lado, desde o início, considerando o "lugar" de onde eu falo, minha escrita esteve atravessada por essas questões a todo momento.
Entendo que tais perguntas somente são possíveis se entendermos que a produção do conhecimento possui um “para que”, uma finalidade, e um “para quem”, um destinatário, que ela não ocorre por ocorrer, por um movimento sem um sentido ou natural. O “para que” e o “para quem” pesquiso indicam uma forma de implicação da minha produção – uma das maneiras como estou implicado naquilo que produzo. Entendo, assim, que a produção do conhecimento (da qual faço parte ao escrever este blog inclusive) não se dá de forma neutra, avalorativa ou a-histórica – o “para que” e o “para quem”, dentre outras questões, estão a todo momento implicados no conhecimento produzido.
De igual maneira, na medida em que compreendo que práticas e discursos não se encontram em uma relação de oposição, mas antes numa situação de coengendramento – as práticas se constituem de uma tal maneira a partir dos sentidos veiculados pelos discursos, os quais por sua vez se configuram a partir das práticas a que pretendem dar sentido – entendo que a produção de conhecimento é uma forma de ação política, produzir conhecimento é produzir efeitos no mundo. Não acompanho, portanto, aqueles que defendem uma suposta separação entre teoria e prática ou entre a ação e a teorização.
Entendo ainda que essa produção de efeitos não é uma questão de opção daquele que produz o conhecimento – não está na esfera de controle desse sujeito determinar se o discurso produzido terá ou não efeitos no mundo (pois sempre terá), tampouco quais efeitos serão esses (pois os efeitos se dão na interação com outras práticas e discursos para além desse sujeito). O que se pode e se DEVE fazer é a todo momento questionar-se QUAIS os efeitos que o conhecimento que se está produzindo gera no mundo e se tais efeitos são os que efetivamente se deseja produzir (e, não o sendo, mudar).
Esclarecidas essas questões, talvez as respostas às perguntas que intitulam esse post não soem tão “piegas” ou “ingênuas” quanto poderiam parecer se as dissesse logo de início. Eu pesquiso para mudar o mundo e, roubando uma frase da minha companheira de reflexões, “se não para deixá-lo melhor, ao menos para não torná-lo pior”. Pesquiso para colocar em questão as maneiras instituídas de se compreender o mundo num determinado campo e tentar produzir formas outras de sermos nele (no mundo). Pesquiso para mudar o mundo e como em nenhum momento estou “fora do mundo”, pesquiso para mudar também a mim mesmo. Pesquiso, portanto, para todos e, logo, também para mim.

sexta-feira, 29 de abril de 2011

Ausência...

A minha ausência nos últimos dias não foi resistência à análise, nem desistência desse projeto - minha hérnia de disco resolveu entrar em crise de novo e "colocar em questão" a maneira como eu vinha convivendo com ela até então. Acabei de ler um texto do Lourau sobre o objeto e método da análise institucional e não pude deixar de pensar na crise da minha hérnia como um analisador do modo (instituído) como eu vinha convivendo com esse problema (:-P). Depois do susto e com a dor dando espaço para o raciocínio (ainda que sob o efeito do meu opiáceo), em breve estarei me dedicando ao próximo post, que será uma resposta a uma provocação proposta em aula no dia 22/04: Para que pesquisamos? Para quem pesquisamos?

sábado, 23 de abril de 2011

Sobre "falas", "escutas" e controles

Sigo na minha análise das reportagens. Acho que vou excluir o jornal "Pioneiro" da minha análise. Apesar de manter algumas diferenças, normalmente o Pioneiro traz as mesmas matérias da Zero Hora, diferenciando-se apenas em relação ao conteúdo regional. Dificilmente a abordagem dos temas muda de um jornal para o outro, e muitas vezes as reportagens são praticamente (quando não são de fato) idênticas. Creio que vou poupar tempo (e estômago) examinando apenas o Correio do Povo e a Zero Hora daqui por diante. Tenho que lembrar que isso aqui não é uma pesquisa para uma dissertação, nem algo parecido.

Peguei hoje os jornais do dia 09/04. Acho que notei uma certa tendência da Zero Hora em enfatizar o sofrimento das famílias das vítimas, da comunidade, e os discursos sobre como pais e professores devem abordar o assunto com seus filhos e alunos. O Correio do Povo, por sua vez, está dando mais destaque para o que autoridades estatais de diversos níveis tem a dizer e o que estão propondo fazer a respeito do ocorrido.

A capa da Zero Hora desse dia traz em letras vermelhas a frase "O QUE DIZER ÀS CRIANÇAS" e, como podem notar, não era uma pergunta. Internamente, a matéria recebe o título "Discuta a chacina com as crianças" (fl. 40) na forma imperativa que reproduzo. Não está em questão, de forma imediata, se devemos ou não falar sobre isso - a questão está em como falar. Talvez isso seja um desdobramento do tal "debate exaustivo" defendido no Editorial publicado no dia anterior e que comentei em outro post. A matéria começa contando a história de um professor que chega em sala de aula e encontra os alunos só falando a respeito da chacina, tendo dedicado a aula para falar do tema. Após colocar a pergunta "Como explicar o que foge a toda racionalidade?", segue-se a manifestação de duas psicólogas sobre como falar com as crianças a respeito dos acontecimentos e sobre como agir e não agir diante das crianças. A matéria termina com a manifestação de uma conselheira da Associação Brasileira de Psicopedagogia: "- Se o tema vier, tem que falar. Mas se não vier e for possível evitar falar, melhor." As três são indicadas como fontes de um quadro de informações apresentado no meio da página seguinte, intitulado "Um tema que merece ser debatido" (fl. 41), que apresenta os seguintes tópicos: "Quando não falar", "Quando falar", "A importância de ouvir" (aqui, aliás, foi colocada uma das declarações que eu achei mais interessantes - Se o adulto desviar do assunto, pode acontecer de a angústia permanecer dentro da criança, virando um medo mais permanente), "A mensagem a passar", "Com que profundidade falar do assunto", "Conter o próprio nervosismo", "Quando filtrar".

Ao lado desse quadro, está uma entrevista com alguém que é apresentado, em destaque, como doutor em Psicologia, e posteriormente informado que se trata também de um professor universitário, encabeçada por uma frase em destaque dita pelo entrevistado: "A pior coisa é fingir que não aconteceu". As perguntas reproduzidas na entrevista foram:
"As crianças expostas ao noticiário do massacre podem desenvolver algum transtorno?"
"De forma geral, qual é o impacto desse episódio nas crianças?"
"As crianças brasileiras terão de passar por isso?"
"O que fazer se a criança ficar com medo de ir para a escola?"
"Como as escolas devem tratar o tema?"
Em resposta à segunda pergunta, o entrevistado termina sua resposta dizendo que "O sentimento de perda é de todo o Brasil. A sociedade está em luto. O luto passa por cinco fases: raiva, negação, negociação, culpa e aceitação da perda." Por isso a terceira pergunta foi se as crianças teriam que passar por isso, ou seja, passar por essas "fases do luto", ao que o entrevistado respondeu inclusive que, ao ser atrapalhada a "elaboração do luto", "A criança pode ficar travada no meio do caminho, na raiva, na culpa." Interessante notar que, nessa resposta, poderiam ser citadas quaisquer fases do luto abordadas anteriormente, mas o entrevistado cita a raiva e a culpa. Por que não a negação ou a negociação?

Para mim, a "preocupação" que está colocada é com um possível "trauma" que possa ser causado às crianças que estão acompanhando os fatos através dos diversos meios de comunicação. Essa preocupação, contudo, não me parece traduzida em termos de uma preocupação com um genérico "bem-estar" dessas crianças, mas sim com um possível abalo psíquico que possam sofrer por elaborarem "mal" essas notícias.  As perguntas feitas na entrevista estão atravessadas por essa preocupação, na minha opinião, desde a primeira, que já traz o questionamento sobre um possível "transtorno" que possa  ser produzido. Considerando que está se falando de um acontecimento cuja "causa" é traduzida em termos de "desequilíbrio psíquico" do agente, parece que há uma preocupação que, com esse fato (ou melhor, por conta das notícias sobre esse fato), possam se produzir mais "transtornos" e "desequilíbrios", potencializando o "perigo".
Temos, então, a ênfase na "fala". Essa "fala", parece-me, é trazida como mecanismo principal para evitar que esse "perigo" seja gerado - "falar" torna-se não uma alternativa, mas um imperativo - uma ferramenta para que ocorra uma "elaboração adequada" acerca desse evento, evitando que se traduza em termos de "raiva", "culpa", ou de a "angústia permanecer dentro da criança". Quem é chamado para defender a importância dessa fala? Os profissionais da "escuta": os psi. Diante desse contexto, no entanto, entendo que a "fala", mais do que um mecanismo terapêutico, representa a possibilidade de se descobrir o que está "no interior" do sujeito - se o perigo vem de dentro (de um "desequilíbrio psíquico") devemos fazer os sujeitos falarem sobre o que está "dentro deles" para que possamos saber que outros perigos podem estar por aí.

Na mesma página é apresentado um artigo de alguém que é qualificada como "jornalista de 35 anos, mãe de uma criança de seis anos", intitulado "Como explicar o horror?". Um trechos desse artigo chamou minha atenção:
"O horror não se explica por situação econômica, social, cultural ou geográfica. Ele pode estar dentro de nós, humanos que somos. Aquela parte sombria, adormecida, terrível e sórdida que, em algum momento, pode tomar a forma de um rapaz que assassinou nossos filhos"
Aqui transparece a ideia que comentei antes, a de que o perigo está dentro de nós, e potencialmente dentro de todos nós. O início da fala afasta alguns determinismos que orienta(r)m algumas políticas na área da segurança pública e, ao mesmo tempo, aponta esse "determinismo" que eu comentei em outro post: um "determinismo psíquico", em que no "interior do sujeito" está a raiz para os atos que ele irá cometer e a medida do perigo que ele representa. Será que as políticas a serem produzidas a partir desse determinismo produzirão a vigilância de todos, por todos?

Um dos editoriais da Zero Hora foi sobre os acontecimentos, intitulado "Trauma coletivo" (fl. 16), afirmando que esse é o momento das famílias e escolas enfrentarem o trauma coletivo vivido pelas crianças diretamente envolvidas e pelas que acompanharam de alguma forma o ocorrido por todo país. Fala ainda que "Os mesmos meios de comunicação que têm dedicado amplos espaços à chacina vêm se encarregando de alertar uma sociedade  ainda sob o efeito do choque para a necessidades de haver o máximo possível de transparência em relação ao ocorrido." Novamente, temos aqui a ênfase na necessidade de falar sobre o que aconteceu, de haver o máximo de transparência (para que nada fique oculto?). Concluindo ainda que: "Esse é um aspecto particularmente importante: evidenciar o fato de que cada indivíduo é responsável pela construção de um mundo menos violento." Esse raciocínio traz consigo também a ideia de que a violência é uma questão de indivíduos, de condutas individuais, o que invisibiliza a compreensão da violência como uma questão social e cultural, ideia que também apareceu no artigo que comentei anteriormente.

Ainda, nesta edição, a coluna de abertura da Zero Hora, escrita pela Cláudia Laitano, foi sobre o ocorrido, e um trecho dela traduz o que está sendo feito dos acontecimentos do Realengo:
"Foram muitas as abordagens da tragédia de Realengo nas últimas horas - algumas apressadas demais, outras irresponsáveis até, mas todas, de alguma forma, refletindo uma necessidade urgente de digerir em conjunto essa dor. [...] a última quinta-feira vai ser lembrada como o dia em que o Brasil chorou - não apenas as mortes das crianças do Realengo, mas a impossibilidade de proteger nossos filhos do imprevisível."

No Informe Especial (fl. 3), um quadro traz a seguinte colocação:
"Caindo de maduro. Se a doença mental do assassino do Realengo tivesse sido diagnosticada e tratada, hoje o Brasil não estaria discutindo a segurança nas escolas."

Na seção de artigos, dois dos três apresentados tratam dos acontecimentos no Realengo (fl. 17). Num deles, intitulado "Que as crianças me perdoem", o autor faz alguns questionamentos em relação ao direcionamento da discussão em torno da tragédia, principalmente das medidas a serem tomadas: "Frustrados na expectativa de obtermos uma confissão, somos levados a mudar o foco da nossa indignação. Pouco importa que nas escolas públicas do Rio não haja porteiros nem guardas, o que é necessário é um controle maior das armas, mesmo sabendo-se que temos a mais rígida legislação sobre o assunto da América Latina. Pouco importa que o atirador, sem idade para a aquisição legal de arma de fogo, as tenha obtido no mercado negro, disponível nas diversas favelas cariocas onde a polícia não se atreve a entrar. Pouco importa se não temos acesso psiquiátrico facilmente disponível no nosso sistema de saúde para a prevenção de um surto esquizofrênico dos doentes latentes."
O artigo direciona as medidas a serem tomadas para as seguintes: prevenção situacional (porteiros e guardas nas escolas), combate ao contrabando de armas (por meio do controle das favelas) e atendimento psiquiátrico (para prevenção de surto em doentes latentes). Acho que li alguma coisa sobre a tendência de enfoque na prevenção situacional no livro Cultura do Controle, do Garland... Aliás, as duas outras medidas também se caracterizam por buscarem um controle, seja das favelas, seja dos "doentes latentes".

No outro artigo, intitulado "Tragédias em espaço sagrado", os acontecimentos no Realengo são encaminhados pela autora como uma necessidade de "[...] uma grande discussão pública que busque revisar todo o sistema educativo, o que inclui a educação formal da escola e a educação familiar." É o primeiro movimento que vejo no sentido de colocar o ensino em questão por conta dos acontecimentos no Realengo. Não a estrutura das escolas, mas o ensino mesmo, com o que está implicado nele e, nesse ponto de vista, necessita de mudança.

Na coluna "Brasília" (fl. 17), uma nota intitulada "Reação" informa que na semana seguinte iniciam as reuniões do governo sobre a criação de um novo projeto para incentivar o desarmamento no país, a ser elaborado pelo Ministério da Justiça e pela Secretaria dos Direitos Humanos.

Paulo Sant'Anna, em sua coluna, intitulada "Paraíso e inferno", fala sobre "os dois hemisférios do cérebro do assassino", onde um seria "completamente avariado, doente", e o outro seria "saudável, raciocinante", concluindo com a colocação de supostas antíteses: "Como pode aquela beleza natural carioca abrigar tanto sangue derramado pelo crime? Como pode uma cidade tão musical, tão romântica, tão poética, ser ao mesmo tempo a mais violenta e a mais sangrenta do país?" O questionamento em torno dessas antíteses também é a sua afirmação enquanto antíteses e a afirmação de que existem tais antíteses. Será a emergência de uma lógica antitética que, ao mesmo tempo que diminui as fronteiras entre o "bom cidadão" e o "violento psicopata", por afirmar a possibilidade de encontro dessas duas personagens em uma mesma pessoa, coloca a necessidade de vigilância de todos por todos?

quinta-feira, 21 de abril de 2011

Sobre segundos olhares (2)...

Reexaminando o jornal Correio do Povo do dia 08/04, achei mais duas matérias interessantes. Uma delas saltou-me aos olhos depois de ter feito aquele post analisando o Editorial da Zero Hora desse mesmo dia. Intitulada "Bulllying pode ter motivado execuções" (fl. 32), a matéria afirma que os motivos que levaram o ex-aluno a desferir pelo menos 30 tiros são desconhecidos, mas "Bullying, fanatismo religioso e até influência de episódios ocorridos nos Estados Unidos podem ter motivado o ataque." Novamente, mas em outro jornal, é produzida a relação entre o bullying e as mortes ocorridas na escola. É interessante que em nenhum outro ponto da matéria essa relação é explorada, tampouco explicada - ela é simplesmente colocada.  O bullying está na pauta do dia e das explicações.

Outro ponto que chamou a atenção, mas nessa edição é apenas uma nota, foi a notícia intitulada "Menino armado na aula" (fl. 33), onde é apresentada a situação de que um adolescente que portava uma arma de fogo dentro da sala de aula havia sido "apreendido" pela Brigada Militar de Arroio do Sal. Novamente, é significativo por ter sido publicada na mesma edição que tratou dos eventos ocorridos no Realengo.